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#ContaPraGente com Andressa Giongo

Apesar de estarmos em meio a uma pandemia, a segunda edição do #Contapragente é para trazer um pouco de alento ao nosso coração. É para falarmos sobre saúde dentro das organizações. E que bacana quando este tema é colocado em pauta pela nossa gente de RH – e gente qualificada.

De forma generosa e com muito carinho, quem vem contar pra gente é a Andressa Giongo, que atua há mais de 15 anos na área de Gestão de Pessoas e é a atual superintendente de RH na Unimed Porto Alegre. Formada em Psicologia pela PUCRS, com MBA em Gestão Empresarial pela FGV-RS e Especialização em Human Resource Management pela Universidade da Califórnia, cursou também Mestrado Profissional em Economia Empresarial pela UFRGS e o programa para executivos na Columbia Business School.

Muito se fala, nos últimos anos, acerca da importância de um RH estratégico, que fala a língua do negócio, que mede indicadores e resultados. Mas, até que ponto, na ânsia de dar reputação aos números, não esquecemos da verdadeira essência da área, que passa por cuidar dos valiosos mais ativos que são as pessoas?

Cuidar das pessoas é selecioná-las para o lugar certo, pensar no seu desenvolvimento, reconhecer desempenho para mantê-las engajadas e motivadas, com uma remuneração e benefícios atrativos, mas toda esta cadeia perde o sentido quando o profissional está com a saúde mental debilitada. Para Andressa:

“falar sobre saúde mental não é algo recente, mas a pandemia do COVID-19 obrigou a colocar uma lupa sobre o tema dentro das organizações. Quando falamos sobre o assunto com especialistas, o que se sabe é que algumas pessoas já carregam em si uma predisposição para desenvolver doenças mentais, porém o ambiente como gatilho, também é um fator importante. Precisamos pensar seriamente na cultura e no clima organizacional que estamos proporcionando para as nossas pessoas. A depressão já tem sido vista como uma das principais causas de afastamento do trabalho. Este é um indicador preocupante do ponto de vista de saúde pública e privada. O RH, enquanto área, tem um papel relevante no sentido de potencializar e fomentar essa discussão. A primeira etapa que as consultorias, conhecedoras do assunto, recomendam é falar sobre o assunto na esfera da organização, para depois pensar no que fazer a respeito. Dar visibilidade e sensibilizar as lideranças para o tema. Passamos muito tempo falando de performance, de entrega de resultados e do desenvolvimento de competências, mas o que muitas vezes não nos damos conta é que existe uma base que antecede a isto, as pessoas precisam estar muito íntegras para conseguir entregar todos esses elementos”.

Existe um longo caminho pela frente, mas o ponto de partida é “sensibilizar as pessoas sobre a temática e suas implicações”, mas não sem antes de quebrar uma série de tabus e paradigmas. Como abordar temas como depressão e ansiedade em um cenário onde sempre existiu a percepção de que estas questões são confidenciais e as pessoas não devem sequer partilhar tais temas com a empresa? Como fica a percepção dos líderes ou da própria Companhia, quando tais fragilidades pessoais são expostas? Num mundo em que somos ensinados a vencer e ser fortes, como apresentar-se vulnerável?

De fato, ainda não há espaço para esta discussão em todos os lugares. As empresas abordam o tema saúde mental e bem estar com diferentes entendimentos e níveis de maturidade. Ainda existe uma onda de empresas e de executivos que não conseguem tangibilizar a importância do assunto. É possível deparar-se com gestores com o entendimento de que as empresas não devam dar conta dos problemas psicológicos de seus trabalhadores. Percebe-se o quão desafiador este tema é, quando abordá-lo no âmbito organizacional não é nem mesmo uma unanimidade entre profissionais de RH.

Andressa percebe um momento importante de transição, em que “ainda é possível perceber organizações focadas na entrega do básico, do resultado no final do ano, mas também se vê empresas com solo fértil para desenvolver a perspectiva do cuidado com a saúde e com o bem-estar. Falar sobre felicidade e satisfação, cuidando a integridade das pessoas e com um alinhamento de propósito é o que vai levar a uma entrega de resultado de longo prazo. O olhar das organizações para questões relacionadas ao propósito, aos impactos sociais e ambientais gerados,  é uma realidade. Se as empresas quiserem se manter competitivas terão que estar atentas para estes temas continuamente.

Fazer acontecer esta transição vai depender do apetite de cada organização a não ficar meramente no discurso. Não adianta vender esta experiência para o colaborador ou para o cliente, se dentro da jornada eles não experimentarem isso como uma verdade. Os consumidores estão mudando, os colaboradores também estão querendo se conectar a uma empresa com um propósito de impacto, alinhado com seus próprios valores. É uma mudança na mentalidade coletiva, liderada principalmente pelas gerações mais novas, que pressionam por organizações inspiradoras. A discussão vai ganhando mais espaço e prosperarão aquelas que conseguirem captar essa essência.

Tratar saúde mental dentro das empresas, com base no segredo vem se modificando ao longo do tempo. Já não cabe mais aquela máxima de que os problemas pessoais devem ser tratados da porta para fora do trabalho. O grande paradoxo é que literalmente esta máxima deixou de existir porque estamos em tempos de home office, levando o trabalho para dentro de casa. Então, estamos mais abertos para pensar: – Como assim? Levar o trabalho para dentro de casa pode, mas levar nossos problemas para dentro da empresa não?

Especialistas falam que o tema da saúde mental deve ganhar cada vez mais espaço porque tem impacto na linha dos resultados. Existe uma preocupação com a produtividade. Para Andressa, “o mal-estar, a depressão, a ansiedade e todas as doenças psicológicas associadas têm uma implicação nas entregas. Existe um conceito chamado “presenteísmo”, em que a pessoa está lá de corpo presente, mas não está exercendo o seu potencial máximo, sem aquele brilho emocional necessário para exercer suas tarefas”.

Outro ponto importante abordado pela Andressa é desmistificar a crença de que os líderes devem ser vistos como super-heróis, que não sofrem e não ficam doentes. Eles também podem desenvolver depressão, síndrome de Burnout ou ansiedade. Neste sentido, as lideranças precisam ser muito bem cuidadas, é necessário um sistema de gestão que os acolha. Se o cuidado não começar pelos líderes, é possível que as equipes também desenvolvam problemas. Andressa conta que:

“na Unimed Porto Alegre o desenvolvimento das lideranças está sendo feito respeitando três pilares: o foco no resultado, que prioriza os desafios técnicos e a capacitação para a melhor entrega dos números,  o foco nas questões relacionais e na gestão de equipe e um terceiro foco fundamental, que é o Pilar do autocuidado. Dentro deste pilar estão algumas ações de saúde e de bem-estar, sensibilizando os líderes em relação a essa temática. Só para que possam ter uma ideia, fizemos recentemente um desafio de 21 dias de meditação, em que os convidamos a participar deste momento por 30 minutos: das 06h30 às 07h. Foram 21 dias corridos, não paramos no sábado e no Domingo. Estávamos curiosos quanto à adesão para esta prática e o objetivo foi estimular com que cada um tivesse um momento consigo. Temos clareza de que é preciso ser feito um investimento no autoconhecimento e a meditação é só um recurso. Também estamos com um canal com abordagens ativas para saber como estão os nossos colaboradores, eu mesma já fui alvo de uma abordagem através do chat, questionando como eu estava naquele momento. Penso que é muito bacana quando alguém está entrando em contato só para saber como eu estou. Esse tipo de ação promove esse olhar para a importância do cuidado. Na semana passada participei de uma reunião semanal com 100 pessoas em que eu retomei aquela máxima que a gente ouve bastante, de que precisamos colocar a máscara de oxigênio primeiro em nós mesmos, para depois assistir aos nossos filhos, esposo ou seja lá quem for”.

Andressa também compartilha alguns experimentos que têm sido feitos neste momento da empresa. Algumas ações podem até parecer mais triviais como por exemplo “mude 1 hábito por dia” e outras mais profundas, como grupos de conversas para compartilhamento. Foram feitas ações, também com o público que está trabalhando presencialmente neste momento de pandemia, aqueles que estão na linha de frente da saúde, em que se teve uma seção específica com o objetivo de acolhimento. Foram disponibilizadas dicas de alimentação e de como ter um equilíbrio melhor com a saúde de forma integral.

Na percepção de Andressa, fora do Brasil existem países que já estão muito mais à frente em relação ao tema, implementando práticas e ações concretas, por terem se dado conta do retorno que isso traz para os negócios. É importante o RH ter um olhar de resultados sobre o tema. Quando se começa a fazer uma série de ações, isso tem um custo e o acionista quer um resultado, então é preciso mostrar que isso tem um valor que ultrapassa o mero cuidado em si. Um ambiente saudável e propício tem impacto nas boas entregas, tem um retorno resultante desta ação.

O Brasil caminha ao seu ritmo, algumas empresas têm oportunidades de beber de fontes externas, principalmente as multinacionais, em que esse cuidado já está na cultura e no DNA.  Na visão otimista da Andressa, “em 2021/2022 este tema vai entrar numa crescente, porque os números falam por si. É muita gente adoecendo nas empresas por depressão, ansiedade, burnout e inúmeros outros transtornos. Alguém vai pagar essa conta além da própria pessoa, então eu acredito muito na propagação deste tema. Temos que garantir um mínimo de integridade para as pessoas conseguirem trabalhar com dignidade e realizar o seu potencial. Pessoas felizes vão entregar melhores projetos, configurando-se numa relação de ganha-ganha”.

Respeitando a máxima que questiona quem cuida do RH para o RH poder cuidar dos outros, o público de RH também deve estar preparado para suportar estas ações dentro das empresas. Neste sentido Andressa fala que:

“a primeira coisa é exercitar o poder do exemplo, cultivando esse olhar do cuidado e acolhendo as nossas pessoas. Precisamos trabalhar num nível de conexão com quem trabalha conosco, a proximidade é fundamental para você conseguir naturalmente identificar quando existe alguém que não está bem e que precisa de alguma ajuda. Preciso primeiro exercitar e praticar dentro do meu time. Estamos funcionando também como um grupo de apoio para as pessoas da linha de frente da saúde, pessoas que estão trabalhando numa escala 24 por 7, sem sábados e domingos para o lazer, e precisamos estar inteiros para apoiar em questões que possam facilitar. O segundo passo é agregar conhecimento técnico em relação ao assunto. Estamos estudando muito e hoje eu tenho uma Líder que é responsável pela saúde corporativa da empresa. É uma estrutura que foi criada há mais ou menos um ano dentro da Unimed Porto Alegre e ela é responsável por olhar a temática de saúde física e mental em todas as suas dimensões, conhecendo as características da nossa população interna, para poder prover soluções adequadas. Sinto que aqui foi um exercício mais fácil do que eu imaginava, porque já existe uma crença central de saúde e de bem-estar, já temos um nível de maturidade e um mote de “cuidar de quem cuida”, então a resistência fica muito menor, o que não quer dizer que seja de fácil implementação”.

Ao finalizar o #ContaPraGente Andressa reforça um recado, para todos nós, profissionais de RH, convocando todos a despertarem para este tema tão importante. Ela reforça que é sim nosso papel trazer ao debate este assunto de forma a alcançar mais pessoas dentro de cada empresa. Se todos vierem juntos, inúmeras pessoas sairão beneficiadas, temos um papel muito bonito do ponto de vista social. Ela reforça que olhar para a saúde dentro das organizações vai ser cada vez mais importante e que todos temos que desmistificar a crença de que isso não é um problema da empresa. “À medida que eu tenho uma pessoa que não está com seu potencial pleno, isso passa a ser também o papel da organização, de acolher, de dar o suporte e desenhar estratégias que possibilitem que esse profissional esteja dentro do seu equilíbrio emocional, físico entre outros. É libertador poder conseguir dar este suporte principalmente em um País que infelizmente não permite essa condição para todos.

Gratidão Andressa, por dar voz e colocar em pauta um tema tão sensível. Ficamos felizes de poder contribuir na propagação desta pauta e estimular o olhar da saúde dentro das organizações! Foi um prazer!

Beijos,

Lú, Márcia e Gus